“O homem começa a morrer na idade em que perde o entusiasmo”. Honoré de Balzac
Evany Lira
Montanha/ES – Se, “O homem começa a morrer na idade em que perde o entusiasmo”, como disse Honoré de Balzac, Dona Julinha, como carinhosamente é chamada, está, com seus 101 anos, numa idade em que a vida se faz muito presente e pujante. Isto porque, traz o entusiasmo no sorriso, no olhar e na fala ao relatar sua vida de agora e a vida vivida nestes 101 anos.
“Penso que nem tenho esta idade. 101 anos é ano, minha gente, não é brincadeira não! Meu Pai do céu!” foi com estas exclamações que Dona Júlia Fortunato de Jesus iniciou nossa conversa.
Perguntada qual a receita, ela prontamente responde: “Não tem receita. Vivo. É Deus que me dá. Vivo bem com todo mundo. E vivo bem!”. Com um sorriso largo ela nos conta que é muito raro ir ao médico. Tão raro, que há poucos dias foi ao hospital, e tanto a atendente quanto o médico lhe perguntaram: “mora aqui”?
Dona Julinha disse não ter a receita para a longa vida que tem, mas aos poucos, seu relato vai nos dando os paradigmas para se atingir a longevidade. Dona Júlia, que já morou embaixo de lona e enfrentou todas as dificuldades que os desbravadores desta região enfrentaram nos idos da década de 50, como os perigos da mata virgem, as dificuldades de comunicação e falta de acesso aos bens sociais como saúde, educação e até mesmo a compra de alimentos, conta que apesar das dificuldades, teve uma vida maravilhosa, uma vida feliz ao lado de seu companheiro, Antônio de Souza – Português, que era um marido exemplar, carinhoso e cuidadoso.
Que em sua vida nunca faltou o pão e a diversão. Lembra com entusiasmo das festanças, ocasiões em que dançavam a noite toda, “de pé no chão. Os sapatos, minha filha, eram jogados de lado”. E ela exclama: “Aquele tempo, era bom demais. As famílias se respeitavam. A gente brincava com todo mundo. Dançava com todo mundo. Divertia e voltava pra casa feliz”.
Notamos aqui, que um dos ingredientes da receita de vida de Dona Júlia, para se viver 101 anos, é a felicidade. Encontrar a felicidade nas mínimas coisas que a vida oferece.
Outro ingrediente que absorvemos da fala de Dona Júlia, é o trabalho. Ela nos conta que sempre trabalhou muito, e que ainda trabalha. Sua filha Maria Dada, que acompanhou toda nossa conversa, disse que Dona Júlia ainda faz todo serviço doméstico, lava, passa, cozinha, limpa casa: “Não faz mais por que a gente não deixa”, disse. E foi prontamente interrompida por Dona Júlia, que me contou: “Veja só, minha filha, ela fala assim pra mim: ‘mãe, você fica lavando roupa, as pessoas veem isto e vão falar’. E eu digo pra ela: Deixa falar. Não vou parar”, e complementa entre sorrisos: “se eu parar de trabalhar, vou ficar toda dura e enferrujada”.
Ela nos conta orgulhosa que cozinha uma galinha como ninguém, e que seu neto Wagner Ribeiro, fala: “galinha como a da minha vó, ninguém faz”.
Podemos notar aqui mais um ingrediente da receita que Dona Júlia nos dá. Viver em harmonia. Ela já nos contou que vive bem com todo mundo. E, na família, vive cercada de carinhos e cuidados. Mas sempre foi assim. Dona Júlia nos conta também que o marido era maravilhoso, paciente e companheiro. E hoje, vive cercada pelos carinhos da filha, do genro, netos (5), bisnetos (7) e tataranetos (4); além dos vizinhos que têm por Dona Júlia muito carinho.
Perguntada sobre sua alimentação, Dona Júlia afirmou comer de tudo: “tenho a mesma alimentação que os demais membros da família. Como carne – de porco, de boi. Como pimenta, muita pimenta”, disse.
Dona Júlia diz que o segredo de sua felicidade é que seu marido não podia vê-la triste, que logo procurava dar fim à sua tristeza, e que assim, ela aprendeu a viver sem dar lugar para a tristeza em sua vida. Que hoje, a única tristeza que carrega é a falta que sente do marido, falecido há 42 anos, e por quem ela ainda chora.
Dona Júlia foi uma das colonizadoras do solo montanhense. Aqui chegou, vinda da Bahia, em 1949, mas diz com determinação: “Sou filha de Montanha. Daqui, só saio para o cemitério”, finaliza.
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